quinta-feira, setembro 14, 2006

Uma estratégia falhada

Desde a saída de João Rocha da presidência do Sporting que o clube perdeu poder nas estruturas dirigentes do futebol, numa primeira fase por dificuldades inerentes à transição de liderança do clube, com Amado de Freitas, depois devido à ingenuidade do consulado de Sousa Cintra e mais tarde, já fruto de uma politica consciente, nas presidências de Roquette e Dias da Cunha, que assumiram a luta pela regeneração do dirigismo desportivo e a sua obediência a regras estritas de ética e justiça desportivas, na senda da introdução em Portugal das Sociedades Anónimas, da qual o Sporting foi aliás pioneiro.

Não vale a pena recordar as afirmações dessa altura, em que era sublinhada a necessidade de contenção verbal e comportamento irrepreensível por parte dos dirigentes na gestão das novas sociedades, tendo como pano de fundo a legislação específica que estavam obrigadas a respeitar, até porque rapidamente ficou claro que as regras e intenções não eram iguais para todos.

Tendo vivido intensamente o futebol em pleno período de “regulação” azul, com leves pinceladas de vermelho, nomeadamente entre 1985-1995, encarei com bons olhos a escolha dos novos dirigentes leoninos, que defendiam o fim dos “jogos de bastidores” e promoviam uma estratégia de desenvolvimento do futebol alicerçada numa inequívoca igualdade competitiva e justiça desportiva.

No entanto esse objectivo, quanto a mim, deveria ser atingido no máximo em duas épocas desportivas, tempo mais que suficiente para implementar as medidas necessárias a uma mudança efectiva de processos, que aliás não eram (nem nunca foram) reconhecidos pelos principais intervenientes no espectáculo (dirigentes, árbitros, treinadores, jogadores e jornalistas) nem pelos adeptos de norte a sul do país, a menos que os prejudicassem directamente.

É por esse facto que, a partir de determinada altura, achei claro que existiam apenas três caminhos a seguir pelos dirigentes do Sporting:

- Manter a politica adoptada, em prejuízo claro do clube
- Assumir a impossibilidade de alterar e corrigir a situação, fechando as portas do clube
- Implementar as medidas mais eficazes de forma a competir em plano de igualdade com os restantes adversários, de acordo com as regras do “mercado”

A opção que passei a defender foi a ultima, exigindo a “integração” do clube no ambiente próprio que o rodeava e assumindo a utilização do mesmo conjunto de regras e comportamentos dos demais.

Não era a opção desejável, concerteza que não, mas era a única que defendia EFECTIVAMENTE o clube nesse contexto, mesmo que indo contra os mais básicos principios de honestidade e honorabilidade, que são (e muito bem, apesar de irrelevantes neste contexto) defendidos por um grande número de sportinguistas.

E se por acaso ainda houvesse alguém com dúvidas em relação ao tema, cá estamos a alguns anos de distância, preparados para assistir a mais uma machadada na desejada livre concorrência e justiça desportiva no futebol português, traduzida na anulação do processo “Apito Dourado” e na reabilitação de algumas das “tenebrosas” figuras que já haviam sido condenadas no passado, e que se aprestam para ver o seu nome limpo (adivinho que logo em seguida apareçam os pedidos de indemnização da ordem), tudo porque a lei para estes casos é, descobre-se agora, inconstitucional.

É o próprio Estado que falha miseravelmente nesta questão (que não ensombra apenas o futebol), depois de ter sido visto pelos dirigentes do Sporting (e muito acertadamente, embora com demasiado optimismo, afirmo eu) como o parceiro ideal no combate à limpeza geral do dirigismo desportivo.

Podem agora alguns afirmar que ainda assim preferem ter mantido um comportamento sem mácula, em vez de alinhar pela rebaldaria geral. Mas a pergunta mantém-se... que ganhou o Sporting com isso?

Os mais puristas, ainda estonteados pelo golpe, agarrar-se-ão certamente à questão da honra, suspensos no entanto pela dúvida que levantou Dias Ferreira nos últimos dias, relativamente à inocência dos dirigentes leoninos, antigos ou presentes.

Que fique claro que, salvo informação em contrário, tenho como certo que pelo menos desde 2001 será muito dificil arrastar um dirigente de cúpula do Sporting para o mesmo nível de Loureiro, Costa, Veiga ou Vieira. Mas e no passado mais longínquo, não saltará um duque qualquer?

Mas mesmo ultrapassando esta questão, mantém-se a minha dúvida relativamente à importância da honra.

Para que serve? Quantos títulos alcança? É premiada com alguma distinção especial?

Neste caso específico a honra é pessoal e refere-se apenas a um comportamento individual que, embora digno de registo, é responsável por prejuízos incalculáveis para o Sporting.

Quem sabe a nova lei vá alterar alguma coisa, responsabilizando também os clubes por condutas impróprias dos seus dirigentes, mas tomando como exemplo tudo o que está em vias de acontecer, a pergunta que fica é:

- Vale a pena existirem regras (leis) se não são para serem cumpridas e se o seu incumprimento não acarretar penalizações?